13.10.06

Buchecha e Banco Imobiliário

Ontem foi dia das crianças. No momento, enquanto espero paciente o dia em que a barriga vai crescer e uma criancinha vai sair de dentro dela, só tenho uma criança que dependa de mim pra ser feliz nesse dia: Luiz Phillipe.


Ele é filho da Graça, que foi trabalhar lá em casa 6 dias depois que eu nasci, quando a minha mãe percebeu que o projeto hippie de não ter babá não ia dar nada certo. Dois anos depois o Tiago nasceu, e a Graça além de babá virou madrinha dele, prova de que o lado hippie da mamãe não queria morrer de jeito nenhum. Eu já tinha sete anos, praticamente uma mocinha, quando a Julia nasceu, e renovaram-se as razões pra Graça continuar lá em casa.

Hoje eu moro sozinha em outra casa, a Julia já fez 20 anos e a Graça continua lá, firme e forte. No caso dela aquela metáfora "ela já é da família" é totalmente verdadeira: ela é madrinha do Tiago, que por sua vez é padrinho do Luiz Phillipe. Assim como a Conceição, a outra fiel escudeira da nossa família, mora com os meus pais há 28 anos, e o Luiz virou logo o mascote da casa.

Quando a Graça ficou grávida foi aquele choque. Ela era a pessoa menos engravidável que a gente conhecia: tímida até a raiz dos cabelos, nunca tinha tido um namorado (que a gente soubesse). Era tão impensável o fato que ninguém tinha reparado na barriga que crescia até ela contar pra minha mãe, já com quase 5 meses de gestação.

O Luiz Phillipe nasceu e ganhou todo mundo de cara. Hoje ele tem 12 anos, é um menino esperto e divertidíssimo. Pois ontem era dia das crianças e o Luiz estava lá, vendo tv, como todo dia. E o jornal dizia das várias programações infantis do dia, todas dependendo da animação de um adulto pra levar. Ontem o adulto fui eu, e o programa foi o show gratuito do Buchecha e do Latino na Quinta da Boa Vista. Ele ficou animadíssimo, era a primeira vez que ia ver um show de alguém famoso, me disse, só tinha ido nos do Rodrigo.

Quatro da tarde, saltamos eu e Luiz de um taxi nos arredores da Quinta da Boa Vista, e nos misturamos ao mar de gente que andava entre camelôs com brinquedinhos que piscam e vendedores de churrasquinho, pipoca, hot dog e milho verde. Adentramos a Quinta e era criança feliz pra todo lado, criança chorando arrastada pela mãe aqui e ali, e uma chorando sem a mãe, que apareceu um minuto depois e as lágrimas voltaram pra dentro automaticamente, que nem cachoeira invertida.

Andamos, andamos, andamos, até achar o palco onde Buchecha já cantava. O mar de gente de antes virou nada diante da multidão que se apinhava ali, pacificamente, alegremente, pra ouvir o cara cantar. O Luiz estava fascinado e meio que paralisado: era muita gente, e mal dava pra ver o palco, que dirá o Buchecha. Show de gente famosa é assim, expliquei, fica lotado e a gente fica longe mesmo... Um binóculo foi a solução, e aí ele adorou. Eu era o peixe mais fora d'água do mundo, com a minha cara de garota de Ipanema no coração de São Cristóvão, mas nem liguei e desencavei do fundo da memória meu repertório de funk melody e dancei animadíssima.

Teve
"nossa história vai virar cinema, e a gente vai passar em Hollywood", teve "quero te encontrar, quero te amar, você pra mim é tudo, minha terra meu céu meu ar", teve "eu não existo longe de você, e a solidão é o meu pior castigo, eu conto as horas pra poder te ver, mas o relógio tá de mal comigo", teve um monte de outras que eu não me lembro mas que são ótimas, e o pessoal cantava tudo e dançava amarradão, e eu fiquei feliz de participar da felicidade popular e estar ali, eu e Luiz, tendo um dia das crianças diferente e animado.

Quando o Buchecha acabou e começaram a arrumar o palco pro Latino, Luiz quis ir embora, e apesar da minha curiosidade pra ouvir “hoje é festa lá no meu apê” ao vivo, concordei e adorei, que as pernas já estavam reclamando. Pegamos outro táxi pro Humaitá, nos enchemos de milkshake, cheeseburguer e batatas fritas, e depois que eu recuperei um pouco as forças fui levar ele em casa.

Chegando lá mais felicidade: a Julia comprou de presente pra ele um Banco Imobiliário, jogo da nossa infância que virou luxo hoje em dia: custa R$65,00, pode? Em tempos de crianças cada vez mais solitárias, não é de se espantar que elas queiram cada vez mais videogames, e que os pais apóiem: é mais barato, e eles brincam sozinhos, sem encher o saco de ninguém...

Mas ontem foi diferente! Abrimos o Banco Imobiliário e os olhos de todo mundo brilharam. Eu, Tiago e Julia de novo crianças, doidos pra jogar! Mas somos todos adultos agora, e Julia ia pra casa do namorado, Tiago ia sair com os amigos, e eu, exausta, propus pro Luiz uma partidinha rápida, só pra ele começar a aprender...

Em cinco minutos estávamos todos reunidos em volta da mesa, Tiago de consultor imobiliário do Luiz, Julia de banco, todos gritando pra comemorar compras de terrenos valiosos ou pra protestar contra dados generosos demais com o outro, rindo juntos como há tempos não acontecia, uma noite fenomenal em família.

Vim pra casa dormir alegre e plena, feliz da decisão de fazer um dia das crianças bacana pra esse menino que eu adoro, e de ter tido eu um dia especial assim.

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